Volkswagen vai duelar com sindicatos para economizar R$ 60 bilhões até 2026

Na Europa, ações do grupo são negociadas a 28% de seu valor contábil; necessidade de economizar mais de R$ 60,2 bilhões, até 2026, pode levar a demissões em massa

HG
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13.09.2024 às 21:20 • Atualizado em 27.11.2024
Na Europa, ações do grupo são negociadas a 28% de seu valor contábil; necessidade de economizar mais de R$ 60,2 bilhões, até 2026, pode levar a demissões em massa

A Volkswagen está rasgando acordos trabalhistas em vigor desde 1994 e pactuados até 2029. Nesta semana, o grupo alemão confirmou que pode fechar fábricas e promover demissões em massa, na Alemanha, a partir de junho do ano que vem. Como já havíamos alertado, a rescisão unilateral do acordado deve respingar no Brasil, o que acende a luz amarela para os trabalhadores e consumidores brasileiros.

“As garantias acabarão, efetivamente, em meados de 2025 e as medidas visam reduzir custos domésticos, devolvendo competitividade para a marca na Alemanha”, declarou o chefe de recursos humanos da VW, Gunnar Kiliam, que também é membro do Conselho de Administração.

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O leitor pode pensar, ingenuamente, que a crise jamais irá atingi-lo, na medida em que não trabalha na empresa e nem investe em papéis da Volks. Ledo engano, porque a precarização estrutural certamente alcançará os produtos – em outras palavras, a redução dos custos não se limitará a cortes de mão de obra, mas também implicará no inexorável barateamento de todos os custos de produção, desqualificando ainda seus veículos.

“Temos um, talvez dois anos para recuperar nossa marca principal”, reconhece o vice-presidente financeiro (CFO) do grupo, Arno Antlitz. Como se vê, tudo aponta para o fim da ‘era Volkwagen’, até porque num mundo onde a competição se torna cada vez mais acirrada, a meta da VW deixa ser o crescimento comercial e os ganhos de capital para focar o corte de 10 bilhões de euros (mais de R$ 60,2 bilhões) em custos, até 2026. E diante deste quadro, classificar a situação como desesperadora pode não ser tão exagerado quanto parece:

“Até hoje, sempre foi possível conjugar as metas administrativas com a força de trabalho, mas, agora, não devemos fazer isso em discussões públicas”, ponderou o ministro-presidente da Baixa Saxônia, Stephan Weil – para quem não sabe, o governo local tem 12% de participação acionária na companhia e 20% dos votos do conselho. “Você pode sentir, desde a semana passada, que há uma grande preocupação”, completou Weil.

A verdade é que a Volks não consegue manter sua hegemonia, diante da virada da eletromobilidade. Na Europa, os veículos elétricos (EVs) chineses já respondem por 25% do mercado e mesmo com o aumento das tarifas de importação na União Europeia, para 38%, o “protecionismo neoliberal” não conseguirá salvar os fabricantes do Velho Continente da invasão chinesa.

A BYD, por exemplo, está construindo sua primeira fábrica europeia na Hungria (com capacidade de produção anual de 200 mil unidades) e as tarifas não são aplicadas a modelos de marcas chinesas, mas apenas a automóveis efetivamente produzidos na China e exportados.

Investimento arriscado

Para piorar a situação, os analistas financeiros estão advertindo os investidores de que aproveitar o momento para comprar ações subvalorizadas da Volkswagen é, na verdade, uma estratégia arriscada.

É que o fato de os papéis do grupo estarem sendo negociados por 28% de seu valor contábil esconde um problema maior do setor automotivo, afinal, este é um fenômeno que se estende a outras gigantes, como a Stellantis (-51%), a Mercedes-Benz (-71%), a BMW (-56%), a Toyota (110%) e a Tesla (-1.012%).

 “Em o mercado europeu em queda, é difícil para a Volkswagen. Com a migração do capital produtivo para a China, a Europa se tornará cada vez mais fraca e não apenas no setor automotivo, mas em termos industriais como um todo”, avalia o professor e diretor do Centro de Pesquisa Automotiva (CAR) da Universidade de Duisburg-Essen, Ferdinand Dudenhöffer.

De fato, cortar cabeças na VW – frise-se, na Alemanha – é mais difícil de ser aprovado do que em outras empresas do setor, justamente por causa da participação do governo da Baixa Saxônia que, na base daquilo que os terraplanistas brasileiros chamam de “comunismo”, frequentemente fica do lado dos sindicatos.

Thorsten Groeger, negociador-chefe do principal sindicato alemão, o IG Metall, disse que os planos da companhia podem resultar em “custos adicionais” para a Volks de quase 1 bilhão de euros (o equivalente a R$ 6,22 bilhões). É que, acabando com as garantias, os salários subiriam (em respeito a acordos anteriores de negociação coletiva. “Haverá uma resistência feroz”, alerta Groeger.

Mesmo estando a uma distância oceânica da Europa, o brasileiro pode ter uma certeza: de que a Volkswagen sempre operou por aqui na base do neocolonialismo e que, enquanto o consumidor tupiniquim se submeter aos seus preços escorchantes, ele estará ajudando nas remessas de lucro que, em última instância, comporão na tentativa de salvar a matriz alemão.

Eu, que cubro o setor automotivo há três décadas, estou muito impressionado com os rumos que a coisa vem tomando, até porque a situação emergencial assumida pela direção do grupo parece revelar, apenas e tão somente, a “ponta do iceberg”. Pessoalmente e diante de minha modesta capacidade financeira, é uma marca que, daqui para frente, procurarei evitar. Já o leitor é senhor de si e sabe quanto custa cada centavo de seu suor...

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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