Os perigosos carros batidos sem registro de PT que voltam ao mercado
Seu automóvel se envolve em um grave acidente, daqueles que logo se imagina o registro de PT (Perda Total) na seguradora. Na oficina, o mais complicado e caro, de acordo com o laudo, é a troca da longarina, que se empenou com o forte impacto.
A longarina é uma espécie de perfil de aço responsável pela resistência estrutural do carro. É sobre duas longarinas longitudinais (da frente até a traseira do carro) e algumas transversais, entre elas, que se apoia a carroceria.
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No caso de ela se deformar, a recomendação do fabricante é removê-la integralmente e substituí-la por outra nova. Uma operação complexa tecnicamente, com especificações de local de corte e solda, além de elevado custo financeiro.
A solução adotada por muitos reparadores é mais simples, barata e “lambona”, ameaçando colocar em risco a segurança de quem dirigir aquele carro depois: aquecer a longarina onde se deformou e forçá-la de volta. Ou então utilizar o famoso “Cyborg”, um equipamento que aplica uma enorme força sobre a peça empenada e a “corrige”.
Em qualquer dos dois reparos, a longarina fica aparentemente perfeita, mas o aço perde a resistência original, comprometendo a solidez da carroceria. Seus ocupantes podem sofrer ferimentos graves ou fatais se o carro se envolver num outro acidente de proporções similares.
Pesquisa comprova o risco
Uma entidade inglesa independente de segurança veicular decidiu fazer um teste tipo tira-teima para avaliar as consequências de reparos efetuados fora do padrão em automóveis seriamente acidentados.
Provocou uma grave colisão entre dois Ford Focus e levou-os para a oficina. O primeiro teve a longarina substituída, de acordo com a recomendação da fábrica. O segundo manteve a longarina original, porém recuperada e com sinais de solda e de reparo mal-feito.
Os dois automóveis foram então submetidos a uma espécie de crash-test. O Focus reparado corretamente se deformou, mas preservou os “ocupantes” (bonecos). O outro teve uma deformação muito maior, as rodas dianteiras se deslocaram para trás com intrusão de 9 centímetros do painel e pedais no interior da cabine.
Os “dummies” revelaram que os passageiros do primeiro carro sairiam andando. Os do segundo Focus iriam para o hospital, ou para o necrotério.
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Maracutaia Made in Brazil
No Brasil, a situação não é melhor, antes pelo contrário. Foram realizados testes semelhantes pelo Cesvi (Centro de Experimentação e Segurança Viária) e os resultados foram semelhantes.
Dizem as estatísticas que pelo menos 15% dos nossos automóveis já passaram por reparos estruturais, 70% deles realizados fora do padrão das fábricas. Ou seja, colocando em risco a vida de seus ocupantes no caso de um acidente.
Não existe fiscalização, homologação nem presença obrigatória de engenheiro nas oficinas mecânicas. Isto significa que os milhões de dólares investidos pelas fábricas em engenheiros que cuidam da segurança ativa e passiva dos automóveis vão para o ralo. Por incompetência ou para reduzir custos, às vezes por exigência de seguradoras.
Sem registro no Detran...
No país do salve-se quem puder, não há registro preciso no Detran de carros acidentados e quase destruídos. Teoricamente, o policial de trânsito deveria elaborar um relatório descrevendo o tipo de dano sofrido pelo veículo classificando-o como leve, médio ou grave. Neste último caso, a seguradora o classifica como “PT” (Perda Total) e o vende em leilão.
Uma oficina o adquire para repará-lo numa operação “lambança” e ele surge depois numa loja de usados com ótima aparência, pintura brilhando e mecânica “perfeita”. E que se dane a vítima que se acha esperto por levá-lo pagando menos que o valor de tabela, sem saber tratar-se de uma verdadeira bomba relógio.
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...Mas as seguradoras têm a informação
Entretanto, a real situação do automóvel está registrada pela CNSEG (Confederação Nacional das Seguradoras), que recebe esta informação de todas as companhias de seguro e a disponibiliza apenas para suas associadas.
O incauto que compra um destes carros sem mínimas condições de segurança percebe a maracutaia quando a seguradora se nega a segurá-lo. Informada pela CNSEG, ela sabe o tamanho do risco que está correndo em função das precárias condições do veículo.
A CNSEG lidera, portanto, uma verdadeira máfia das seguradoras, mantendo em sigilo informações altamente relevantes para a segurança do usuário. Quando deveria, é óbvio, comunicar às autoridades de trânsito quais os veículos nestas condições, para evitar que voltem a circular.
Se o governo brasileiro fosse minimamente preocupado com a segurança veicular, exigiria ser informado pela CNSEG dos automóveis acidentados, para que só voltassem a circular depois de vistoriados por oficinas homologadas.
Mas esta preocupação em identificar a “lambança” iria prejudicar as seguradoras, pois as oficinas não teriam mais tanto interesse em arrematar os destroços de automóveis que elas colocam em leilões. Se não interessa às poderosas seguradoras…
Em nota, a CNSeg presta o seguinte esclarecimento a respeito da coluna:
Em resposta à reportagem publicada pelo jornalista Boris Feldman nos portais Auto Papo, Vrum, Auto Entusiastas e Mobiauto:
A Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) repudia a matéria em que é qualificada como líder de uma máfia que envolve as seguradoras de veículos.
A reportagem tem informações equivocadas e desde já esclarecemos que não é desta maneira que funciona o registro de acidentes.
Os registros de danos decorrentes de sinistros de média e grande monta são de responsabilidade dos Detrans, que detêm a base de dados. Vale acrescentar que apenas 30% da frota nacional de veículos tem seguro.
Quando a seguradora recebe um veículo sinistrado, ela classifica o mesmo em dano de pequena, média ou grande monta na base de índice nacional do Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores).
Quando há registro de boletim de ocorrência automaticamente é realizada uma classificação do tamanho do dano do veículo. No entanto, quando não há a formalização de um B.O, cabe ao dono do veículo se responsabilizar pela destinação do mesmo, ou seja, informar a sinistralidade do veículo nos órgãos de trânsito dos estados caso o carro seja reparado e trazido novamente à circulação.
Não há responsabilidade da seguradora neste processo e vale acrescentar também que as seguradoras não vendem veículos reparados.
A CNseg não possui qualquer informação sobre a natureza dos acidentes, sobre os reparos realizados nos veículos, em que condições esses reparos foram feitos e o destino dos carros, inclusive para leilão. A única informação que a CNseg reúne, compartilhada pelas seguradoras associadas e com objetivo de combate à fraude, é se o veículo tem algum registro de sinistro.
A CNseg considera o conteúdo da matéria calunioso e de muita gravidade.
Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.
Jornalista Automotivo