Carros voadores: o que já é realidade e o que ainda não passa de sonho

Enquanto veículos particulares parecem restritos ao mundo dos Jetsons, aerotáxis são mais viáveis em mercado de R$ 15 trilhões que aguça de Hyundai a Nasa
JC
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08.07.2021 às 11:00 • Atualizado em 12.11.2024
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Enquanto veículos particulares parecem restritos ao mundo dos Jetsons, aerotáxis são mais viáveis em mercado de R$ 15 trilhões que aguça de Hyundai a Nasa

Por Homero Gotardello

Não é de hoje que motoristas do mundo todo sonham com carros voadores. Os primeiros testes remontam à década de 1940, enquanto reportagens das décadas de 60 e 70 projetavam um mundo bem diferente do atual, no qual pequenas naves como a dos Jetsons fariam parte da vida das famílias, nas grandes cidades, pelos idos de 2010.

Como se sabe, já ultrapassamos essa data há uma década e os automóveis capazes de rivalizar com pequenas aeronaves ainda são – e devem seguir sendo – elemento de ficção. “Apesar de sua viabilidade técnica, esse tipo de veículo ainda habita o campo da fantasia”, pondera o analista Asad Hussai, da PitchBook, uma das líderes globais de análise de mercado e soluções completas para transformação digital (SaaS) empresarial.

Enquanto veículos particulares parecem restritos ao mundo dos Jetsons, aerotáxis são mais viáveis em mercado de R$ 15 trilhões que aguça de Hyundai a Nasa
Futuro imaginado pelo desenho Jetsons ainda parece muito distante quando falamos em veículos voadores

“Os fabricantes levarão anos e anos em uma luta inglória para conseguir certificações junto às agências reguladoras, principalmente no que tange às exigências de segurança. Há uma limitação intransponível em ter um modelo que consiga aprovação nos crash tests, para rodar em estrada e que, ao mesmo tempo, seja leve o suficiente para decolar”, avalia Hussai.

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Primeiro carro voador real custa R$ 3 milhões

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Liberty PAL-V é o primeiro carro voador que será efetivamente comercializado

No campo da realidade, as coisas caminham bem devagar, mas em fevereiro deste ano a Agência Europeia de Segurança Aeroviária (EASA) concedeu uma certificação inédita ao fabricante holandês PAL-V, homologando seu compacto Liberty para venda depois de ele cumprir cerca de 1.500 requisitos. 

O Liberty não é, exatamente, um carro que voa, mas – ao contrário – um giroplano capaz de rodar em ruas e estradas. Pelo preço sugerido de US$ 600 mil (o equivalente a mais de R$ 3 milhões), ele leva apenas dois ocupantes em voos meio desengonçados que estão muito longe de impressionar. 

Prova de que ele não deve se tornar um campeão de vendas é que a própria PAL-V espera comercializar apenas 90 unidades do modelo nos próximos anos.

“Um avião que você pode pegar na estrada, ao invés de enfrentar a burocracia dos aeroportos, muda tudo”, afirma o presidente-executivo e cofundador da PAL-V, Robert Dingemanse. 

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Quem poderá conduzir o PAL-V? Essa pergunta a sua fabricante ainda não respondeu

“A aviação executiva tem um complicador, que é o fato de seus usuários ficarem presos em um aeroporto depois do pouso. Criamos uma solução para este problema, uma aeronave que você tira da garagem, decola e, depois de pousar, não necessita de hangar. Em solo, basta dirigi-lo até seu destino final”, conta Dingemanse.

O executivo não detalha como o piloto/condutor que quiser rodar com o PAL-V terá que se habilitar ou licenciar, nem como as regras de tráfego terrestre e aéreo serão aplicadas à sua criação.

Mas o leitor, principalmente aquele que entende de automóveis, não pode ser ingênuo a ponto de crer que uma aeronave vai operar livremente, como se fosse um pássaro, sem requerer habilitação especial, obedecer qualquer tipo de legislação nem pagar impostos.

De qualquer forma, o Liberty é até agora a única opção concreta para quem deseja um carro voador hoje.

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Um carro voador esportivo com motor BMW

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Klein Vision AirCar é um superesportivo com motor de BMW que voa (literalmente)

Na última semana, o AirCar, protótipo desenvolvido e construído pela Klein Vision, na Eslováquia, estrelou as manchetes globais depois de concluir um voo de 35 minutos entre os aeroportos de Nitra e Bratislava – esta última, capital do país. 

É verdade que, viajando pela estrada, o mesmo veículo levaria 56 minutos (apenas 21 minutos a mais) para ir de um ponto a outro, consumindo menos da metade do combustível, mas o voo não deixa de ser um feito digno de nota, até porque o AirCar (existem dois protótipos deste modelo) é um automóvel atraente em termos visuais.

Possui linhas esportivas e motor – de origem BMW – com até 300 cv de potência, caso do Prototype 2. 

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Klein Vision nos céus

Para esta configuração mais avançada, a Klein Vision divulga alcance de 1.000 quilômetros, teto operacional de 2.500 metros e velocidade de cruzeiro de 170 km/h – vale lembrar que é possível viajar mais rápido do que isso em uma “autobahn” alemã.

Apesar do feito, é importante frisar que o AirCar ainda aguarda certificação e que, antes de obtê-la, é impossível falar no início das suas vendas. Até porque atender exigências de órgãos reguladores rodoviários e aeroviários não é nada simples e, pelo menos para os grandes investidores, esta seria uma missão próxima do impossível.

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O AirCar com as asas fechadas, em sua configuração para uso no asfalto

Americanos e chineses na cautela

Aliás, é exatamente isso que se extrai da transferência do desenvolvimento do Transmition, criado pela norte-americana Terrafugia, para a China, poucas semanas depois de o carro voador californiano conseguir seu certificado de aeronavegabilidade da Administração Federal de Aviação (FAA) dos Estados Unidos. 

A Terrafugia é uma subsidiária da Geely chinesa e esta última confirmou, em maio, o encerramento das operações norte-americanas para uma reavaliação do programa – na verdade, tratava-se da pá de cal sobre o projeto. 

“A empresa não planeja lançar seu carro voador nos Estados Unidos”, declarou o gerente geral da Terrafugia, Kevin Colbunr. “Até mesmo os planos para a China são incertos”, acrescentou.

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Projeto Terrafugia Transmition foi passado de americanos para chineses e, agora, está congelado

Enquanto a Geely abandona o barco, a PAL-V planeja para o final de 2022 as primeiras entregas do Liberty. Sua cadeia de fornecedores inclui a divisão alemã da Mitsubishi, que produz peças compostas para a fuselagem – a companhia já produz peças semelhantes para a Porsche e a Lamborghini. 

“Estou perplexo com o ceticismo sobre os carros voadores, afinal eles podem cumprir as exigências governamentais atuais, não demandam criação de infraestrutura e são bem diferentes dos táxis aéreos autônomos (drones, também chamados de eVTOL), que requerem gerenciamento de espaço aéreo e a construção de vertiports para operações urbanas”, avalia Robert Dingemanse.

No melhor estilo paraguaio e na base do ‘la garantia soy yo’, como todo bom vendedor, Dingemanse foca os benefícios de seu produto sem detalhar os senões: “Um carro voador é algo que você possui, que pode te levar de porta a porta, abrindo um mundo de possibilidades”, defende.

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Hyundai aposta em táxis aéreos

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Futuro pode estar em drones gigantes e autônomos usados para transportes de passageiros

Pelo menos uma das gigantes do setor automotivo, a Hyundai, discorda do cofundador da PAL-V, apostando suas fichas exatamente nos eVTOLs que Dingemanse tanto critica. 

A marca sul-coreana espera ingressar no segmento dos táxis voadores em 2028, com modelos para aplicações urbana, com capacidade para até seis pessoas, e metropolitanas, ligando cidades com capacidade ainda maior. 

“As pessoas que se queixam do trânsito pesado verão como é conveniente se deslocar em veículos aéreos. Queremos ser os primeiros deste mercado, mas com o produto certo”, declarou o chefe da unidade de mobilidade aérea da marca, Jaiwon Shin, ao apresentar um protótipo desenvolvido em parceria com a Uber. 

“Veremos a demanda por este tipo de veículo explodir”, prevê Shin, baseando-se em um estudo da Morgan Stanley que estima um mercado de até US$ 2,9 trilhões (o equivalente a R$ 14,7 trilhões) para os aerotáxis autônomos, até 2040.

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Hyundai já tem o seu protótipo de eVTOL desenvolvido em parceria com a Uber

A previsão mais pessimista dos analistas é para negócios da ordem de US$ 615 bilhões ou R$ 3,3 trilhões neste novo setor. Antes de 2035, estas aeronaves seguirão operadas por pilotos e só depois desta data espera-se que as versões inteligentes e autônomas se tornem dominantes. 

“Podemos estrear já em 2023, com foco na segurança e uma variante para carga, com capacidade para 300 quilos de mercadorias. Queremos nos beneficiar de nossa estrutura de vendas e serviços, em todos os continentes”, disse o executivo.

O chefe de mobilidade da Hyundai reforça a importância deste novo negócio, citando os volumes de vendas da Boeing e Airbus, que entregam, cada uma, menos de 1.000 aeronaves anuais. “Já a produção de nosso tipo de veículo aéreo pode chegar à casa das centenas de milhares de unidades”, prevê.

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Em vez de carros voadores, drones para passageiros

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Convair 118 representa um dos primeiros projetos concretos de carro voador

Por qualquer prisma que se enxergue os carros voadores, resta claro que, para além de projetos e tentativas isoladas, de valorosos e corajosos fabricantes independentes, o uso de drones de médio e grande porte para o transporte de passageiros tem muito mais chances de se consolidar do que os carros voadores. 

Os eVTOLs parecem, sim, uma alternativa viável para trechos de curta e média distâncias e, para tanto, têm aporte da Boeing, da Airbus e até mesmo da Nasa. 

Além das aplicações de táxi aéreo, também podem ser usados para emergências médicas (EMS), serviços de entregas/delivery, uso pessoal e militar. Diferentemente dos carros voadores particulares, que usam motores a combustão interna, os eVTOLs ainda têm a seu favor a propulsão elétrica – mais limpa e eficiente.

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"Sonho de Ícaro" do Convair 118 terminou em acidente...

Já sobre os carros voadores, nominalmente o próprio Liberty, da PAL-V, o eslovaco AeroMobil 4.0, o AirCar, da Klein Vision, e o oficialmente natimorto Transition, da Terrafugia, tudo indica que terão o mesmíssimo destino dos Convair 116 e 118 (da década de 40) e do Aerocar (de 1949), da Taylor – este último chegou a ter seis unidades produzidas. 

Apesar de materializarem o “sonho de Ícaro” em pleno século 21, é seu valor cultural que sobrevive ao fracasso comercial, tendo como mérito a primazia tecnológica. 

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Moller, a empresa que tentou criar carros e até discos voadores, com os do Jetsons, mas nunca tirou nenhum desses veículos efetivamente do chão

Para o leitor que, por fé ou teimosia, ainda crê neste tipo de trambolho, nada mais recomendado do que uma pesquisa sobre o mítico M400 Skycar, da Moller, que consumiu US$ 100 milhões (o equivalente a R$ 0,5 bilhão) em investimentos, durante mais de 40 anos, e jamais fez um único voo. 

O modelo original chegou a ir a leilão duas vezes, no eBay, sem ter alcançado nem mesmo o lance inicial…

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