CES 2024 tem protagonismo dividido entre carros e Inteligência Artificial
A maioria dos brasileiros ainda acha que, para as montadoras, a grande vitrine de seus veículos são os grandes salões do automóvel. Mas a verdade é que, antes mesmo de a pandemia virar o mundo de cabeça para baixo, as feiras de tecnologia, como o Consumer Electronics Show (CES) de Las Vegas, já haviam se tornado palco para apresentação das novas tecnologias automotivas.
Nascido como um evento dedicado ao lançamento de eletroeletrônicos, foi no CES que a Philips apresentou o primeiro videocassete e a Atari, seu primeiro console (o 2600), ainda nos anos 70. Em 1981, foi a vez do CD player fazer sua primeira aparição global – em 1993, foi a vez do MiniDisc e, em 2001, do Xbox.
Mas há dez anos tudo mudou, quando a Audi revelou a tecnologia Matrix que equipa seus faróis LaserSpot – com performance 70% superior aos LEDs – em Nevada. Os fabricantes de veículos tinham descoberto um novo espaço, que só entre os dias 9 e 12 deste mês reuniu 4.300 expositores, recebeu mais de 135 mil visitantes e teve cobertura global de mais de 5.000 jornalistas especializados.
O CES é muito diferente dos salões do automóvel e apesar de os carros-conceito estarem lá, em estandes gigantes como o da Mercedes-Benz, são as tecnologias embarcadas que apontam para o futuro “Com o nosso novo sistema operacional MB.OS, criamos a interface mais avançada do mundo entre homem e máquina”, disse o diretor de tecnologia da marca e membro de seu Conselho de Administração, Mark Schäfer, durante a apresentação mundial do MBUX Virtual Assistant, em Las Vegas.
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“É o primeiro assistente que combina inteligência artificial (IA) generativa e proativa, para tornar a vida a bordo de nossos veículos mais conveniente e confortável. Todos os avanços que apresentamos, nesta edição de 2024, materializam uma jornada em direção a uma experiência hiper personalizada ao volante”, acrescentou.
Mais do que prova cabal de que a virada da eletromobilidade é irreversível, a CES 2024 corrobora uma realidade que a autoestima do brasileiro teima em negar: que o mercado nacional se consolida como vala comum para desova dos modelos equipados com motores a combustão, condenados à morte na Europa e que, mais ou menos rapidamente, vão sendo substituído por EVs, nos países de Primeiro Mundo.
“Não existe condução autônoma apartada da eletromobilidade e, para além do avanço dos modelos verdes, os fabricantes têm a IA com uma espécie de ‘salvação’. A IA está em todos os cantos e a busca dessa alma tecnológica é um passo necessário, essencial, que ganha neste ano uma dimensão humana, lúdica e até social”, pontua o jornalista Jean-Michel Normand, do “Le Monde”, maior jornal francês e um dos mais importantes do mundo.
Honda, Tesla e Hertz
A Honda, única dentre os cinco maiores grupos automotivos do mundo que apostou todas suas fichas no CES 2024, revelou o surpreendente Saloon, carro-conceito que inaugura sua Série 0 e ganha versão de produção daqui a dois anos. Trata-se de um “sedã” 100% elétrico, com arquitetura dedicada e uma interface intuitiva que promete o “prazer de dirigir” de que os EVs, por mais sofisticados que sejam, ainda não oferecem.
“Olhando o modelo, ao vivo, confesso que me lembrou um aspirador de pó portátil, mas o modelo comercial deve trazer algumas diferenças e, não há como negar, que o Saloon mostra a reorientação radical da marca japonesa, rumo a um futuro com emissões zero”, avalia o diretor executivo da “AutoNews” norte-americana, Jamie Manteigas.
Infelizmente para os negacionistas automotivos e contrariando o alarmismo do noticiário da mídia hegemônica norte-americana, os EVs cresceram 45% nos EUA, no ano passado, em relação a 2023 – o volume comercial dos modelos 100% elétricos saltou de 1,1 milhão de unidades para 1,6 milhão – e a expectativa para este ano é um volume de 1,9 milhão de unidades, algo em torno de 13% do mercado doméstico.
As perdas da Tesla, que depois de ver suas ações mais do que dobrarem de valor, no ano passado, as viu despencarem US$ 94 bilhões (o equivalente a R$ 465 bilhões) na primeira quinzena de janeiro, acendem a luz amarela na conta bancária de Elon Musk, mas não têm o condão de frear a virada da eletromobilidade.
“Recentemente, a Hertz comunicou que vai de desfazer de 1/3 da sua frota de EVs, nominalmente modelos da Tesla, mas o presidente-executivo (CEO) da locadora, Stephen Scherr, não revelou que adquiriu estes modelos sem desconto, pagando preços de concessionárias, que não investiu em manutenção especializada, nem orientou seus clientes sobre suas diferenças em relação aos equipados com motores a combustão, que muitas vezes eram alugados com as baterias quase descarregadas, com menos de 50% de sua capacidade”, pontua a diretora de investimentos da Spear Invest, especializada na análise de cadeias de valor, Ivana Delevska.
“Na verdade, todos se perguntam como é que Scherr não foi demitido e todos os analistas do setor, incluindo a 'Car and Driver' e a 'Bloomberg', projetam novos recordes de vendas e participação para 2024”.
Yanfeng, Zeekr e Xpeng Aeroht
De volta ao CES 2024, a feira de tecnologia trouxe novidades muito diferentes dos V8tões e dos superesportivos. A francesa Valeo e a Zeekr, subsidiária de EVs da chinesa Geely, apresentaram um sistema de iluminação ultra personalizável, composto por mais de 1.700 luzes diodo (LEDs). O sofisticado Zeekr 007 fez sua ‘avant première’ norte-americana exibindo o sistema bifuncional Thinbilite, com apenas 15 mm de altura e dois painéis digitais, que só não foi páreo para o Electric Vehicle Interior, da Yanfeng, que abole o volante convencional na sua mais recente conceituação do cockpit de um veículo autônomo (AV).
Na verdade, há um volante, mas ele opera como tela sensível ao toque e teclado virtual num AV de Nível 4 – o display que fica no centro da direção permite acesso a conta de e-mail ou, simplesmente, a um serviço de streaming para escolha de um filme; o volante pode ser deslocado suavemente para a direita, permitindo a visualização do filme na grande tela frontal.
Aproveitando a ausência de Chevrolet, Cadillac, Chrysler, Ford, Jeep, Lincoln e RAM, a Xpeng Aeroht, subsidiária da montadora chinesa homônima, apresentou seu ‘veículo de dupla finalidade’ composto de dois ‘módulos’: um terrestre e outro, aéreo. Por mais ambicioso e futurista que o lançamento pareça, a marca garante que já tem 100 pedidos firmes para o modelo, cujo Ground Module lembra muito a nova Cybertruck, da Tesla, transportando o Air Module, que nada mais é do que um eVTOL ou um drone de médio porte, com cinco pás (rotores) e capacidade para dois ocupantes.
“Na China, as entregas do novo Modular Flying Car começam no quarto trimestre deste ano”, garante o cofundador da empresa, Tan Wang. “Para pilotar o Air Module, o cliente precisa da mesma licença exigida para helicóptero, mas há um modo autônomo, em que o módulo aéreo voa sozinho”, acrescentou Wang, frisando que o lançamento ainda será batizado oficialmente. “Nossos planos são para também comercializá-lo tanto nos EUA, quanto na Europa”.
Em um mundo que não gira, mas capota, a vietnamita VinFast quer invadir os Estados Unidos com dois novos EVs, destacando uma picape conceitual, VF Wild, com linhas “inspiradas no movimento da capa de um super-herói”. O utilitário foi projetado e desenvolvido pela australiana Gomotiv e será produzido pela Torino Design, da Itália. Para encantar os norte-americanos, a caminhonete aposta em versatilidade, permitindo configurar o banco traseiro em cama ou armário com o simples toque de um botão.
A VinFast promete iniciar a produção comercial do modelo já em 2026, portanto antes de a Bosch embarcar sua nova tecnologia, uma evolução do Automated Valet Parking, que é o manobrista automatizado. Trata-se de uma função para estacionamento sem motorista que, agora, inclui carregamento e cobrança autômatos.
“A automação desempenha um papel fundamental na virada da eletromobilidade e acrescentamos duas novas funções que tornam a experiência do usuário muito conveniente”, afirma o de mobilidade muito mais tranquila para os usuários”, vice-presidente da área de produtos de Nível 4 da Bosch, Manuel Maier.
“Estamos moldando o futuro do estacionamento e carregamento automatizados, testando e mostrando uma tecnologia, ainda em fase inicial de desenvolvimento, para que o produto final seja percebido pelos clientes como algo prático e confiável”, acrescentou.
Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.
Jornalista Automotivo