iCar, o carro da Apple, custa R$ 5 bilhões por ano e ainda está atrasado
O leitor que, além de gostar de automóveis, também é ‘applemaníaco’ deve estar cansado de ler, aqui e ali, notícias sobre o modelo autônomo (AV) com o qual a marca da maçã pretende se somar à virada da eletromobilidade. Se este é seu caso, preste bastante atenção, porque o projeto “Titan”, como é conhecido o programa que dará vida ao iCar, encontra-se no limbo neste momento e o lançamento de um pré-protótipo só deve ocorrer em 2026 – na melhor das hipóteses, em 2025.
“A Apple pensava em introduzir este modelo, no mercado norte-americano, com preços a partir de US$ 120 mil (o equivalente a R$ 640 mil). Mas os planos mudaram e, agora, este valor foi realinhado para US$ 100 mil (o equivalente a R$ 530 mil)”, comenta Mark Gurman, colunista da “Bloomberg” que é a referência global do jornalismo especializado, quando se trata dos segredos mais bem guardados da Apple.
“Hoje, há um consenso entre os executivos da empresa de que a tecnologia atual não suporta um veículo sem volante e pedais”, acrescentou Gurman. Portanto, não dê crédito a fotos, fichas técnicas ou qualquer coisa que se apresente como a versão final do iCar. Isso porque até mesmo esta denominação é uma convenção, um batismo informal, já que a própria Apple está muito longe de nomear seu futuro AV.
Em 2016, a companhia investiy US$ 10 bilhões (o equivalente a R$ 53,2 bilhões em conversão direta) em pesquisas e desenvolvimento, cifra que subiu para mais de US$ 25 bilhões (o equivalente a mais de R$ 135 bilhões), neste ano.
“Como se pode ver, o objetivo de lançarmos este produto no mercado já foi traçado, mas precisamos tornar nossos esforços em realidade”, conta o chefe de design e segurança do projeto, Ulrich Kranz, ex-presidente-executivo (CEO) da Canoo e que também foi executivo sênior da divisão de EVs da BMW.
As imagens exibidas até agora do modelo também são mera ficção, mas isso não significa que a Apple esteja para brincadeira. Neste segundo semestre, Kranz recrutou ninguém menos que Luige Traborrelli, que assina as linhas dos Lamborghini Urus, Hurricane e Aventador, para auxiliá-lo na dificílima missão de criar os contornos do futuro iCar.
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“Os planos da marca da maçã incluem contratos próprios de seguro, um centro emergencial dedicado e uma parceria com a Amazon Web para processamento de inteligência artificial (IA) em nuvem”, enumera Mark Gurman, da “Bloomberg” – aqui, não há dúvidas de que o futuro AV terá linhas dignas da expectativa que vem criando.
Um passo atrás
No tópico condução autônoma, a Apple também dá um passo atrás – pelo menos, momentaneamente. O plano inicial era oferecer o primeiro automóvel do mercado global de Nível 5, ou seja, sem volante e pedais.
Nunca é demais lembrar, muito resumidamente, que a Sociedade de Engenheiros Automotivos (SAE International) classifica os níveis de automação da seguinte forma: Nível 0, sem automação; Nível 1, controle compartilhado; Nível 2, mãos do motorista ficam livres; Nível 3, sem necessidade de vigilância do motorista; Nível 4, o veículo roda sozinho, e Nível 5; sem volante e pedais.
“A limitação técnica atual, bem como o teto de investimentos, nos direciona para objetivos práticos”, pontua o vice-presidente de tecnologia da companhia, Kevin Lynch. “Queremos e precisamos dar mais estabilidade ao programa”, completa.
Ele certamente se refere a montanha-russa estratégica em que a Apple embarcou, nos últimos dez anos, desde que revelou seu intento de ter a primazia entre os automóveis de passeio autônomos. O troca-troca de executivos é apenas um indício das dificuldades enfrentadas pelo Special Project Group (Grupo de Projetos Especiais), que é responsável pelo desenvolvimento do iCar.
Cabeças rolaram, na última década, e a única garantia que os gestores têm de permanência no programa é o fato de ele avançar, mesmo que lentamente. “Nossa meta era o lançamento de um veículo autônomo, em 2025. Hoje, o objetivo é assegurar que este produto, realmente, chegue ao mercado”, conta Lynch.
O coração do veículo autônomo da Apple será um poderoso sistema embarcado que eles chamam de ‘Denali’, em homenagem ao pico mais alto da América do Norte, e que terá uma capacidade de processamento quatro vezes maior que a dos chips usados pela linha iMac atual.
“Este chip, que vai operar em conjunto com sensores personalizados, está praticamente pronto para a fase de produção”, afirmou o executivo, destacando que a marcha da Apple segue adiante.
Não podemos desconsiderar que a tecnologia embarcada planejada para o iCar é, realmente, à prova de falhas, já que vai combinar câmeras, radares e sensores LiDAR (a laser), prometendo maior capacitação do que o sistema usado, hoje, pelos modelos da Tesla.
Preço alinhado ao Model S
O realinhamento de preços, que “caíram” quase 20% antes mesmo do lançamento do iCar, tem um claro objetivo: bater de frente – no sentido metafórico – com o Model S, da Tesla, e o novo EQS, da Mercedes-Benz. É um desconto significativo e que cria, sim, uma impressão positiva, já que o estilo do veículo autônomo da Apple pode chocar o público mais conservador.
Apesar de o chefe de design Ulrich Kranz não dar detalhes sobre o assunto, muito se comenta que o Lifestyle Vehicle, da Canoo, será a grande “inspiração” estilística para o lançamento. O modelo, que mescla as linhas de um minivan com as de um caixote, chama atenção pelo perfil que não permite identificar, facilmente, se está indo ou vindo, Mas é bom lembrar que, para além do fato de a marca da maçã não ter medo de inovar, Kranz é egresso da Canoo.
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Este é outro desafio que os cerca de 1.000 colaboradores do braço automotivo da gigante da tecnologia terão que costurar entre os ‘campus’ de Sunnyvale (Califórnia), Phoenix (Arizona), Ottawa (Canadá) e Zurique (Suíça).
O leitor não deve acreditar em tudo o que lê e vê sobre o “Apple Car”, mas existe um background portentoso no que tange à engenharia subjacente, ao design industrial e desenvolvimento de software.
Estes três setores estão concentrados no Sunnyvale, enquanto partes do futuro sistema operacional do carro são desenvolvidas em Ottawa, uma área onde a Apple recrutou, em 2016, um grupo de especialistas da QNX, fabricante de software automotivo de longa data. A equipe de Zurique está desenvolvendo uma ferramenta conhecida como “Rocket Score” que classifica o sistema autônomo do veículo.
“Esta equipe principal enfrentou um revés, no início deste ano, quando Ian Goodfellow, um importante desenvolvedor de IA que liderava o grupo, deixou o projeto depois de não se adaptar à política de trabalho remoto”, conta Mark Gurman, da “Bloomberg”. Já no Arizona, grande parte do trabalho de testes é feito em uma antiga pista da Chrysler, próxima de Phoenix.
“Só esta área, que tem o codinome de ‘Sahara’, foi comprada por US$ 125 milhões (o equivalente a R$ 660 milhões), em 2021. E seguem as provas de condução autônoma com SUVs da Lexus, que foram implantados com o sistema da Apple. Esses protótipos, conhecidos internamente como ‘Baja’, passam por atualizações a cada seis a 12 meses”, explicou Gurman.
E para quem não liga de esperar, pacientemente, pelo futuro iCar, uma boa notícia: a Apple vai consolidar muitos dos times espalhados pelos Estados Unidos, Canadá e Suíça em um novo ‘campus’, no Vale do Silício. A unidade terá cerca de meio milhão de metros quadrados e a construção de suas futuras instalações, iniciada em 2021, segue a todo vapor!
Bom, fora tudo o que trazemos neste texto, o resto é invenção...
Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.
Imagens: Supercar Blondie
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Jornalista Automotivo