Por que Nissan tentará extrair hidrogênio do etanol e Fiat desistiu
Nesta semana, a Nissan anunciou uma parceria com o Ipen (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares) para seguir adiante com o projeto de fabricar veículos movidos pela chamada SOFC (Célula de Combustível de Óxido Sólido).
Em vez de hidrogênio líquido, o plano da fabricante japonesa no Brasil é utilizar o nosso conhecidíssimo etanol para gerar hidrogênio através de catálise e, então, produzir a energia elétrica que moverá o automóvel ou comercial leve.
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Nissan: etanol para gerar eletricidade
A grande sacada do projeto é criar carros elétricos que dispensam a necessidade de recarga externa para as baterias. Em vez disso, o dono apenas abastece o tanque com etanol como em qualquer veículo existente hoje.
Os testes estão sendo feitos com álcool hidratado em proporção de 7% com água, mesmo percentual do combustível que usamos atualmente em nossos carros. A empresa espera evoluir a tecnologia até chegar a 55% de água e 45% do líquido derivado da cana-de-açúcar, o que tornaria os veículos ainda mais limpos em termos de emissões de poluentes.
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O anúncio foi uma grade surpresa em meio a um cenário um tanto obscuro para o futuro do automóvel no Brasil. Afinal, enquanto outros mercados mais maduros caminham a passos firmes rumo à eletrificação, por aqui o processo engatinha, o que pode deixar nosso país isolado tecnologicamente daqui a alguns anos não muito distantes.
Mais do que isso, o anúncio recoloca a Nissan em certa posição de protagonismo, visto que a companhia tem perdido espaço para outras marcas no cenário automotivo brasileiro nos últimos anos.
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Só que os nipônicos não eram os únicos que vinham tentando aproveitar melhor o uso do etanol, um combustível que só “pegou” do Brasil. O antigo grupo FCA, agora Stellantis, também quis emplacar um projeto revolucionário que dava protagonismo ao combustível originado dos canaviais. E o mais surpreendente: em um motor 100% a combustão.
Fiat: um turboetanol com ignição por plasma
Chamado de E4, o propulsor se baseava no 1.3 GS3 T4 que estreou recentemente na Fiat Toro Turbo 270 e no Jeep Compass T270. Contudo, seria movido 100% a etanol e seu objetivo seria reduzir a diferença de cerca de 30% no consumo do etanol em relação à gasolina, sem perder as vantagens do primeiro em termos de desempenho e emissões de poluentes (80% a menos).
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Para isso, contaria com alguns conceitos vanguardistas e outros até óbvios: um deles seria a elevação da taxa de compressão para cerca de 15:1, visto que o etanol tem maior resistência à detonação. Com isso, seria possível ter mais ar na mistura e fazer o combustível render melhor.
Além disso, o E4 contaria com ignição por plasma – quarto estado da matéria, obtido pelo superaquecimento de gases –, capaz de conduzir cargas elétricas da ignição por toda a câmara, promovendo uma combustão mais eficiente, rápida, potente e com melhor aproveitamento da energia gerada.
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Por fim, o sistema “roubaria” uma pequena quantidade de etanol líquido das galerias de admissão para juntá-lo aos gases de escape em um sistema chamado REGR (reformador dos gases emitidos na queima).
Através de um reformador catalítico, o veículo faria a catálise do etanol com os gases e geraria hidrogênio, um elemento com baixa energia de ignição e alta taxa de queima. Ele seria aproveitado na fase de admissão para otimizar a ignição e a detonação do etanol, poupando uma boa dose de energia do motor e melhorando sua eficiência térmica. Fascinante, não?
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Por que a Fiat desistiu e a Nissan não
Todavia, a Stellantis já anunciou ter desistido do motor E4, cuja chegada ao mercado estava prevista para ocorrer já em 2022. Uma pena. A grande pergunta que fica é: se Fiat e Nissan estavam ambas tentando usar etanol para gerar hidrogênio, por que a tentativa de uma fracassou e a da outra seguiu adiante?
A resposta é simples: por mais vanguardista que fosse – membros da Stellantis, na época, chegaram a cogitar que o sistema representaria a “morte do carro elétrico” no Brasil –, o sistema da antiga FCA ainda se baseava no velho e bom motor a combustão.
Para a matriz da agora Stellantis, qual o sentido de investir recursos em um conceito aparentemente tão revolucionário, mas que faz parte de uma tecnologia que está com os dias contados para virar peça de museu?
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Já a proposta da Nissan usa o etanol com fonte para gerar eletricidade e mover os futuros carros elétricos brasileiros com a comodidade de não precisarmos deixar o carro horas e horas recarregando na tomada antes de usá-lo de novo. Faz mais sentido, pensando em longo prazo.
É claro que ainda é cedo para afirmar que o sistema SOFC da Nissan será mesmo tirado do papel e se popularizará no Brasil, mas a marca japonesa parece ter encontrado um caminho mais viável que a rival, aproveitando o que de melhor o combustível vegetal brasileiro, embora ainda um bocado rejeitado por nossa população, tem a oferecer.
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Jornalista Automotivo