Vendas de elétricos crescem 30% e é tarde demais para voltar atrás
Qualquer pessoa adulta e minimamente alfabetizada, que tenha lido pelo menos dois livros em toda a vida, desconfia de qualquer título ou texto que contenha os termos “flopou” ou “flopado”. Trata-se de uma adaptação típica do subjugo cultural tupiniquim, a partir da palavra “flop” que, em inglês, significa fracasso, fiasco.
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É um jargão que, nas últimas semanas, para dizer que a virada da eletromobilidade capitaneada pelos EVs foi frustrada, poderia ser abortada e que os modelos elétricos naufragaram logo na saída do cais.
Na verdade, as vendas globais de veículos elétricos
cresceram 30,2%, no primeiro bimestre deste ano, saltando de 1,47 para 1,92
milhão de unidades. “É fato que, em março, as vendas na Europa diminuíram 11%
em relação ao mesmo mês de 2023, invertendo a tendência do mercado continental,
mas é tarde demais para a indústria voltar atrás”, avalia o sócio e
diretor-geral da consultoria AlixPartners, especializada na área de
recuperação, Alexandre Marian.
Ele destaca que grupos como Volkswagen, Mercedes-Benz e Stellantis, entre
outras gigantes do setor automotivo, investiram trilhões na virada da
eletromobilidade e, neste exato momento, seguem provendo novas linhas de
montagem, mesmo com o enfraquecimento momentâneo da demanda, exclusivamente na
Europa.
Isso porque os números globais apontam no sentido oposto e
os dados consolidados para o primeiro bimestre deste ano mostram que os EVs
responderam por 9% das vendas, nos seis continentes. Melhor, que entre os
modelos eletrificados (soma dos híbridos plug-in e modelos totalmente
elétricos), os EVs acumulam uma participação de 63%.
Na Europa, os números do primeiro trimestre já foram consolidados e revelam uma fatia de 12% para os EVs, contra 7,5% para os híbridos plug-in, 29% para os híbridos puros e 35,5% para os modelos convencionais – ou seja, EVs, híbridos puros e plug-in têm, somados, 48,5% do mercado e 13 pontos percentuais de vantagem sobre os modelos tradicionais. Na fria Noruega, os EVs responderam, sozinhos, por 89% de todo o mercado doméstico, entre janeiro e março, enquanto, na França, eles ficaram com 19% do bolo – 15,2%, no Reino Unido, e 12%, na Alemanha.
Já na China, maior mercado automotivo do mundo (6,7 milhões de unidades, no primeiro trimestre deste ano, contra 3,7 milhões dos Estados Unidos), as vendas de EVs cresceram 13,3% neste ano, somando 1,3 milhão de unidades, contra 785 mil híbridos plug-in e 784 mil híbridos puros – ou seja, atrás da Grande Muralha, os modelos 100% elétricos têm a maior fatia, entre os veículos de novas energias (NEVs).
Nos EUA, os EVs registraram crescimento de 2,6% entre janeiro e março, comparado ao primeiro trimestre de 2023, com um volume de 269 mil unidades. E no Brasil, onde a participação deste nicho ainda é pequena, de 3%, as comercializações cresceram 614%, de 1.980 para 14.134 unidades.
Apoio governamental
Para Mattias Bergman, presidente-executivo (CEO) da Mobility Sweden – associação sueca equivalente à nossa Anfavea -, a queda pontual nas vendas de EVs, na Europa, alerta os países de que este mercado não está pronto para se manter sozinho, no Velho Continente.
“É preciso maior apoio governamental, na forma de subsídios, até que os carros elétricos se tornem realmente acessíveis. Além dos valores de aquisição, seguros e custos de reparos também são mais altos, em relação aos modelos equipados com motores a combustão, e possíveis clientes ainda temem as limitações da infraestrutura de recarregamento”, pontua Bergman.
“Mais do que uma questão mercadológica, temos um sinal de
alerta para os objetivos climáticos da União Europeia (UE)”, acrescenta.
No Brasil, os números mostram uma tendência de crescimento. “O consumidor
brasileiro gosta cada vez mais dos EVs, dando preferência aos produtos mais
modernos e sustentáveis”, avalia o presidente da Associação Brasileira do
Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Bastos.
“É uma tendência que deve se afirmar, desde que o governo
continue dando as sinalizações corretas, como tem feito até agora,
desenvolvendo uma cadeia produtiva e industrial associada ao transporte
elétrico, e consolidando a eletromobilidade como uma das rotas tecnológicas
para a descarbonização da economia”, concluiu Bastos.
Como se vê, os europeus estão preocupados com a contradição que surge entre as
crises orçamentárias dos países da UE e a aprovação pelo Parlamento Europeu, em
fevereiro do ano passado, da lei que proíbe a venda de carros com motores a
combustão, a partir de 2035 – portanto, daqui a 11 anos.
Trata-se de uma regulação que terá efeitos globais, já que
estamos falando do maior bloco comercial do mundo, que estabelece normas em
nível mundial e que, ainda por cima, é sede de algumas das maiores companhias
automotivas do planeta. Ou seja, a virada da eletromobilidade é uma imposição
legislativa que está em curso e, inexoravelmente, respingará por aqui, no
Brasil.
Simples assim...
Jornalista Automotivo