Avaliação: Citroën C3 2023 mostra se aguenta o tranco em teste de 1.200 km
O Brasil está órfão de carros populares. A discussão acerca de um retorno triunfal do segmento, incentivada pelo atual governo, é prova disso. Curiosamente, são duas contestadas marcas francesas, Renault e Citroën, que tentam manter vivo um mercado que parece à beira da extinção. E o novo Citroën C3 1.0 tenta sintetizar todos os atributos de um carro popular.
Diferentemente do Renault Kwid, o C3 tem porte maior até que o de um Fiat Pulse, o que é um grande trunfo seu em relação a espaço interno e versatilidade para uso familiar. E, nas versões de entrada, seu trem de força é composto pelo motor 1.0 três-cilindros 6V aspirado flex mais câmbio manual de cinco marchas, conjunto de Fiat estreado pelo, veja só, Uno!
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Se o coração é de carro popular e as soluções de baixo custo também, a versão que avaliamos, Feel 1.0, custa mais de R$ 85.000, o que por si assusta. Daí que o Brasil está órfão de carros populares mais por não conseguir comprá-los do que por sua inexistência.
Citroën C3 Feel 1.0 MT 2023 – Preço: R$ 83.990. Pintura Branco Banquise com teto preto: R$ 2.200. Total: R$ 86.190
O teste
Em nossa avaliação, rodamos pouco mais de 1.200 km com o C3 2023 por trechos da chamada Rota das Emoções, entre os Estados do Ceará e Piauí. Rodamos com duas pessoas a bordo e, nos trechos rodoviários, sempre com bagageiro quase cheio.
Passamos por Fortaleza (CE) e, de lá, partimos para Icaraí de Amontada (CE). Depois, rumamos a Barra Grande (PI) e esticamos até Parnaíba (PI). Por fim, fizemos a volta até Jijoca de Jericoacoara (CE) e regressamos à capital cearense. Total: 1.219 quilômetros, sendo 80% por rodovias. O trajeto incluiu vários trechos em vias com terra, areia e paralelepípedos.
12 destaques positivos do Citroën C3 Feel 1.0
1) Arrancadas e retomadas na cidade: com motor 1.0, o Citroën C3 1.0 tem muitas limitações. Falaremos mais sobre elas adiante. Tanto que seu 0 a 100 km/h oficial, acima de 14 segundos, só não é pior entre carros 0 km no Brasil hoje que o do Hyundai HB20 aspirado. Entretanto, para se locomover em ambientes citadinos, o C3 Feel apresenta desempenho digno. Ponto para o motor 6V com foco em bom volume de torque a rotações mais baixas.
2) Consumo de combustível: a maior surpresa foiconseguirmos mais de 14,5 km/l de consumo final, mesmo com boa dose de rodagem por estradas de terra batida, areia e paralelepípedos, acima do anunciado pelo Inmetro. Ok, rodamos sem pressa, aproveitando as belezas incríveis da rota, mas estamos falando do Nordeste brasileiro. As temperaturas estavam sempre por volta de 30° C, o sol estava impiedoso como sempre e foi preciso rodar o tempo todo com o ar-condicionado ligado.
3) Ar-condicionado: funcionou de forma muito competente, mesmo em situações de sol e calor fortes. Tanto que sequer precisamos deixá-lo no máximo em nenhum momento. Na intensidade 2, ele já deixava o habitáculo com temperatura agradável.
4) Espaço interno: as dimensões são generosas para os padrões de um compacto, especialmente para a cabeça, devido à boa altura da carroceria. Um casal que pegou carona conosco até elogiou o espaço para as pernas no banco traseiro. O sofrimento maior fica só para a posição do meio.
5) Vidros elétricos por um-toque: ok, a abertura dos vidros traseiros via console central é uma gambiarra pouco intuitiva e ergonômica, a fim de poupar chicotes elétricos, mas pelo menos os vidros do C3 são elétricos com um-toque em todas as posições, tanto para abrir quanto para fechar. E funciona muito bem.
6) Porta-malas com abertura por botão elétrico externo: tem hatch compacto mais caro e com pompa mais premium por aí que não oferece essa comodidade. Outra boa notícia é ter um limpador de para-brisas com duas palhetas.
7) Porta-trecos (cabe garrafa de 1,5 litro na porta e muita coisa no console): os compartimentos para objetos no console central são generosos, o que facilita a vida, especialmente em viagens mais longas. Mas o mais surpreendente foi conseguir repousar garrafas d’água de 1,5 litro nas portas laterais dianteiras.
8) Suspensão na absorção de impactos: o conjunto é barulhento? Sim, até pelo isolamento acústico precário, mas o C3 absorve impactos com competência muito acima do que se espera de um carro de baixo custo. Contribuem para isso os pneus com proporção de 60% de ombro. Eles ajudam a deixar o carro mais macio. Além disso, os ângulos e vão livre do solo são generosos como se necessita em um país como o Brasil.
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9) Central multimídia: rápida, muito fácil de mexer, com boa resolução de tela e não travou em nenhum momento ao longo dos 15 dias que ficamos com o C3 Feel. O Android Auto funciona sem fio, mas prepare-se para ver a carga da bateria do seu celular despencar, pois não há carregador por indução.
10) Acabamento: para a realidade do segmento, é honesto. O nível de rebarbas é até moderado e a peça que mais fica desalinhada é a tampa do porta-luvas. Em nossa viagem, o único ruído de acabamento eventual foi o barulho do quebra-sol batendo contra o teto quando passávamos por ruas de paralelepípedo.
11) Conforto dos bancos: outra grata surpresa. Não senti cansaço excessivo em nenhuma das pernas no roteiro, e chegamos a rodar 4 horas seguidas. Na versão Feel, há ajuste de altura do encosto de cabeça e regulagem de altura para o banco do motorista.
12) Sistema de som: muito bem modulado entre graves e agudos para um carro tão barato. O áudio não fica abafado nem “tremido” como em outros carros.
12 pontos em que o Citroën C3 Feel 1.0 poderia ser melhor
1) Isolamento acústico: tentar conversar a bordo de um C3 na estrada, a 120 km/h, com vento e chuva, é trabalho para os fortes. Para piorar, o ar-condicionado é competente, mas também muito barulhento a partir da velocidade 2.
2) Elasticidade do motor: o Citroën C3 é o mais pesado e menos aerodinâmico entre os veículos que usam o motor 1.0 Firefly. Que, em sua concepção, já possui potência final abaixo da média de mercado (71 cv com gasolina e 75 cv com etanol). Em nossa avaliação, rodamos sempre com o combustível derivado do petróleo no tanque e sofremos para pegar embalo nas retas mais longas de rodovia.
3) Estabilidade no contorno de curvas: as suspensões surpreendem em vias de pavimento ruim, mas são excessivamente molengas e contêm pouco as inclinações tanto laterais quanto longitudinais. Alie a isso um nível baixo de rigidez torcional da carroceria e pneus com banda de rodagem fina e pronto: não dá para sentir segurança em qualquer curva com o C3 a partir de 70 ou 80 km/h, por mais aberta que seja.
4) Alavanca de câmbio: o câmbio manual de cinco marchas, também herdado da antiga FCA, tem as mesmas especificações daquelas usadas em modelos como o Argo 1.0, mudando apenas a relação de diferencial. As relações de marcha, demasiadamente curtas em outros modelos, no C3 ficam até mais corretas, visto que ele demora mais para ganhar velocidade. Entretanto, a alavanca traz o mesmo vício dos Fiat, com engates moles e longos. A ré arranha com frequência, a mão cansa dos movimentos alongados demais e às vezes é até difícil saber se a manopla está engatada ou em ponto morto.
5) Chave antiquada e barulho da trava: pois é, a chave do novo Citroën C3 parece ter sido resgatada dos anos 1990, mas não é só isso que incomoda. As travas elétricas são barulhentas.
6) Estamparia leve demais: a característica acima está ligada a esta outra. Com estampas de aço muito finas e leves, o C3 tem isolamento acústico limitado até para detalhes como o barulho das travas ou do fechamento das portas. Isso sem falar no desalinhamento da tampa do porta-malas em relação à coluna C.
7) Itens de segurança só básicos: o Citroën C3 traz pouco mais do que o básico em segurança conforme exigido pela legislação brasileira: airbags frontais, freios ABS, assistente de partida em rampas
8) Ajuste de altura do volante: não há regulagem de profundidade, o que por si atrapalha na ergonomia, mas o pior é que a coluna de direção despenca com força quando destravamos a alavanca. É preciso ter cuidado.
9) Quadro de instrumentos: Sem conta-giros e cluster limitado.
10) Auxílios a manobras: a direção elétrica levinha é bem-vinda nessa hora, mas faltam sensores de estacionamento e câmera de ré, que não vêm de série nesta versão. Para acrescentá-los, é preciso adquirir um pacote opcional chamado Comfort Pack, de R$ 1.400.
11) Pequenos problemas, grandes reclamações: em março deste ano, a Mobiauto revelou que a rede Citroën já chamava proprietários do novo C3 para correção de pelo menos cinco pequenos defeitos do produto. O número de bugs detectados, hoje, já chega a 15, a ponto de concessionários terem enviado uma carta ao presidente da Stellantis na América do Sul, Antonio Filosa, questionando a qualidade do veículo e do pós-venda da marca, ameaçando um processo contra a fabricante. No nosso teste, um desses pequenos problemas apareceu: o alarme disparou sozinho algumas vezes ao abrir as portas, logo após destravá-las.
12) Freios assobiando: a unidade que pegamos para o teste tinha menos de 5.000 km rodados, e as pastilhas dos freios dianteiros já estavam assobiando. Isso não implica necessariamente que os freios vão falhar. Às vezes, houve mau uso do carro no início da vida útil do conjunto de freios. Por outro lado, pode indicar, sim, que as pastilhas que vêm de fábrica têm uma composição com qualidade abaixo do mercado e que, portanto, são menos duráveis do que deveriam.
Citroën C3 Feel 1.0 MT 2023 – Ficha técnica
Motor: 1.0, dianteiro, transversal,
três cilindros em linha, 6V, aspirado, flex, comando de válvulas variável na
admissão e escape, injeção multiponto de combustível
Taxa de compressão: 11:1
Potência: 71/75 cv a 6.000 rpm (G/E)
Torque: 10/10,7 kgfm a 4.250/3.250 rpm (G/E)
Peso/potência: 10,2/9,6 kg/cv (G/E)
Peso/torque: 74,8/73,4 kg/kgfm (G/E)
Câmbio: automático, 6 marchas
Tração: dianteira
0 a 100 km/h: 14,1 segundos (E) e 15 segundos (G)
Velocidade máxima: 160 km/h (G/E)
Consumo Inmetro: 9,3 km/l com etanol e
12,9 km/l com gasolina na cidade; 10 km/l com etanol e 14,1 km/l com gasolina
na estrada.
Consumo Mobiauto: 14,55 km/l
Dimensões: comprimento, 3.981 mm; entre-eixos, 2.540 mm; largura, 1.733 mm; altura, 1.604 mm; porta-malas, 315 litros; carga útil, 410 kg; tanque de combustível, 47 litros; peso em ordem de marcha, 1.056 kg.
Dados técnicos: direção elétrica progressiva; suspensão McPherson (dianteira) e eixo de torção (traseira); freios a discos ventilados (dianteira) e tambores (traseira); diâmetro de giro, 10,5 m; coeficiente aerodinâmico não divulgado; vão livre do solo, 180 mm; ângulo de ataque, 23°; ângulo de saída, 39°; ângulo de transposição de rampas, 21°; pneus 195/60 R15.
Citroën C3 Feel 1.0 2023 - Itens de série
- Airbags duplos
- Faróis halógenos com luzes diurnas em LED
- Controle de estabilidade e tração
- Assistente de partida em rampa - Hill holder
- Monitoramento de pressão dos pneus
- Painel com faixa central em tom azul metálico
- Ar-condicionado
- Direção elétrica
- Vidros elétricos dianteiros e traseiros com um-toque e antiesmagamento
- Travas elétricas
- Retrovisores externos elétricos com indicador de seta embutido
- Cluster analógico com computador de bordo digital e indicador de trocas de marcha
- Central multimídia Citroën Connect de 10” com Android Auto e Apple Carplay sem fio
- Sistema de som com alto-falantes dianteiros e traseiros, e tweeters dianteiros
- 1 tomada USB tipo A dianteira e 2 traseiras
- Volante multifuncional com regulagem de altura
- Banco do motorista com ajuste de altura
- Limpador e desembaçador elétrico traseiro
- Alarme Perimétrico
- Luzes diurnas de LED
- Rodas de liga leve de 15”
- Painel interno com faixa azul metálica
- Barras longitudinais no teto
- Volante com ajuste de altura e botões de comando do som
- Maçanetas externas na cor da carroceria
- Maçanetas internas em prata fosco
- Molduras nas caixas de roda
- Sensor de pressão dos pneus
- Tomada 12V dianteira
- Limpador e desembaçador do vidro traseiro
- Quebra-sóis com espelhos internos
Vale a pena comprar o Citroën C3 Feel 1.0?
O custo-benefício do Citroën C3 Feel 1.0 MT 2023 é muito interessante para uso na cidade, com foco em economia no consumo de combustível, bom espaço interno para a realidade do segmento, nível decente de conforto a bordo e conectividade básica, mas funcional e sem complicações. A mecânica Fiat ajuda a garantir bons níveis de confiabilidade.
Falta ao novo Citroën C3 Feel 1.0 MT 2023 mais desempenho, segurança e conforto acústico para uso na estrada. Quem pega muita rodovia talvez esteja mais bem servido com outro modelo. Agora, para rodar prioritariamente em perímetro urbano, mesmo em cidades com ruas de qualidade ruim, o novo C3 é, sim, uma boa escolha.
Jornalista Automotivo